Para mim, a cena que mais exemplifica o quanto o agricultor tem o risco correndo em suas veias é, após o término do plantio, olhar para o céu e esperar que a chuva faça o seu papel. É emblemático porque todo o seu dinheiro e esforço já foi enterrado e para que tudo valha a pena é preciso contar com algo que não tem o menor controle, mesmo que as previsões estejam cada vez mais assertivas. Como sabemos o risco é uma característica intrínseca e, até agora, imutável da agricultura. Nós conseguimos controlar algumas variáveis com planejamento e tecnologias, porém outras aparecem de lugares que nem sonhamos e nos faz ficar sempre alerta. Para este setor o risco permeia todas as fases dos ciclos comercial, operacional e financeiro, passando também por incertezas administrativas e judiciais que vão muito além do controle do produtor rural.
No ciclo comercial, que é basicamente a compra de insumos e venda da produção podemos listar: variações de preço em nossa moeda ou mesmo a variação cambial; atraso nas entregas de insumos e produção em função de uma infraestrutura inadequada; oferta limitada de insumos, que podem gerar desabastecimento; entre outros. No ciclo financeiro, que compreende na captação e alocação de recostos financeiros poremos levantar: variações cambiais; alteração abruta de preços; elevadas taxas de juros; custeios que não contemplam os ciclos operacionais; baixa disponibilidade de crédito; e burocracia para conseguir créditos. No entanto é no ciclo operacional que o risco se mostra parte do negócio da agricultura, aqui temos: pragas; riscos climáticos; e dificuldade de formação dos colaboradores.
Agora que listamos alguns exemplos de risco, o primeiro passo para uma boa gestão deles, iremos propor uma classificação para identificar quais deles tem maior impacto no resultado da empresa. Com ela será possível determinar controles e avaliar previamente se estamos preparados para todos aqueles que identificamos. Esta classificação se divide em três dimensões:
1. Gravidade
Está relacionada ao dano que é causado, ou seja, a capacidade de perda resultante daquele risco. Um exemplo é falta de fertilizante, ela pode ter um alto impacto na produtividade.
2. Abrangência
Compreende a quantidade de área que irá prejudicar. O mesmo exemplo citado acima, a falta de fertilizante, se foi por problema no momento da aplicação a abrangência normalmente é baixa, já que pode ser observada e o problema resolvido a tempo, porém se foi alta de suprimento, é possível que atinja todas as áreas, tendo assim uma alta abrangência.
3. Probabilidade
É a chance que isso pode ocorrer. Ainda no exemplo do fertilizante, no momento da compra pode aumentar a chance de faltar em função aspectos geopolíticos, por exemplo, e levar a um problema de desabastecimento.
Essas dimensões serão avaliadas, sem contar com qualquer controle já existente. O objetivo aqui é determinar o risco máximo se nada for feito. Ela deverá seguir os critérios:
Gravidade |
1 | Baixa | Não interfere na produtividade / lucratividade |
2 | Média | Interfere pouco na produtividade / lucratividade | |
3 | Alta | Causa danos irreversíveis na produtividade / lucratividade | |
Abrangência |
1 | Baixa | Danos a um pequeno pedaço do talhão / resultado |
2 | Média | Danos a um talhão inteiro / resultado | |
3 | Alta | Danos a toda a cultura / resultado | |
Probabilidade |
1 | Baixa | Ocorre menos de uma vez por ciclo |
2 | Média | Ocorre ao menos uma vez por ciclo | |
3 | Alta | Ocorre durante todo o ciclo |
O fator de risco será determinado pela multiplicação da classificação das dimensões, ou
GRAVIDADE x ABRANGÊNCIA x PROBABILIDADE = RISCO
Outra avaliação do risco deverá ser feita contemplando os controles propostos, repetindo o processo de dar nota e multiplicando as dimensões e avaliar o quanto o fator de risco foi reduzido com o controle. A avaliação, em ambos os cenários, deverá obedecer a seguinte régua para definir o nível de risco:
Risco |
Pontuação |
Baixo | Até 3 |
Médio | De 4 à 15 |
Alto | De 16 à 27 |
O processo para identificação e classificação dos riscos deverão ser conduzidos por equipes multifuncionais. O importante aqui é levantar qualquer risco em todos os departamentos, sem que haja vetos ou objeções. Em um segundo momento a mesma equipe deverá classificar com as notas e encontrar o fator de risco sem os controles existentes e/ou propostos. Na sequência são levantados os controles relacionados a cada risco levantado e novamente classificado, agora considerando as medidas que já estão no radar para reduzir o risco existente. O importante é que todos eles fiquem menor ou igual a três, e assim sabermos que para cada um levantado existe um controle eficiente já mapeado. Esse processo deve se repetir no mínimo uma vez ao ano ou quando aparecerem novos riscos, seja uma nova praga, lei ambiental, variações não previstas de preço, etc.
Nossa ambição aqui com essa metodologia não é tornar o negócio totalmente seguro, mas é garantir que todos os riscos levantados estejam mapeados e controlados garantindo assim uma melhor gestão dos processos.
Um outro ponto interessante é que o risco pode ser reduzido, porém ele só irá ser eliminado se houver investimento em novas tecnologias, e aí estamos sujeitos ao surgimento e da viabilidade técnica e econômica dela.
Por fim, sabemos que o risco é inerente a qualquer negócio, e como escrito no início, principalmente na agricultura. Porém com um mapeamento correto, ele pode ser gerenciado de forma que torne-se possível que ao olhar para o céu o agricultor tenha a certeza de que as decisões tomadas foram as melhores dentro daquele cenário.