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Produção agropecuária de baixo carbono e segurança alimentar

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(Curadoria Agro Insight)

Hoje, na curadria Agro Insight, compartilhamos uma síntese do texto de Rodrigo C. A. Lima (Advogado, doutor em Direito das Relações Econômicas Internacionais. Sócio-diretor geral e sócio-fundador da Agroicone) e de Leila Harfuch (Economista, doutora em Economia Aplicada, sócia-gerente da Agroicone), sobre os caminhos para alcançarmos uma produção agropecuária de baixo carbono ao mesmo tempo que garantimos a segurança alimentar da população.

O artigo intitulado “Agropecuária de baixo carbono e inovação: Uma agenda essencial para o futuro da agropecuária brasileira” é na verdade um capítulo do livro “O Futuro da Agricultura Brasileira – 10 Visões” . Livro busca compilar em dez capítulos a opinião de grandes analistas e formadores de opinião do setor.

Desafios para a agropecuária de baixo carbono tropical

A evolução da agropecuária brasileira nos últimos 50 anos foi lastreada pelo desenvolvimento de tecnologias e adoção de inovações que permitiram que o Brasil passasse a ser um dos principais players globais na produção de alimentos, biocombustíveis e biomassa.

Em paralelo, relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), aponta que aproximadamente 12% da população global viveu em situação de grave insegurança alimentar em 2020, o que é uma realidade devastadora para a humanidade.

O debate global sobre transformar os sistemas alimentares envolve como aprimorar os sistemas produtivos para permitir uma produção mais adaptada e resiliente, além  de reduzir a intensidade das emissões de gases de efeito estufa (GEEs). Isso ocorre em um contexto no qual o aumento da temperatura e de períodos de seca, as mudanças nos padrões de precipitação, alagamentos, incidência de pragas e a intensificação de eventos climáticos causam prejuízos enormes para a produção de alimentos e, de for- ma mais ampla, para a segurança alimentar.

A agropecuária está intrinsecamente ligada às mudanças do clima, na medida em que sofre impactos do aquecimento global e gera emissões. Fortalecer maneiras para que os sistemas produtivos busquem se adaptar aos principais impactos do aqueci-mento global em suas regiões e fomentar a adoção de tecnologias e práticas produtivas que permitam reduzir emissões de GEEs e, preferencialmente, incrementar a produção de alimentos, energia e biomassa é um desafio para a agropecuária.

O Brasil teve, com o Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças Climáticas para a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de Carbono na Agricultura (Plano ABC) 2010–2020, uma política que permitiu reduzir 170 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2eq)1 em uma área de 52 milhões de hectares (Manzatto, 2020).

Antes do Plano ABC, o Brasil não possuía uma política que ordenasse e incentivasse a implementação de práticas produtivas e tecnologias que favorecem a redução da intensidade de emissões de GEEs na produção agropecuária e que, sobretudo, per- mitem fomentar a adaptação dos sistemas produtivos. Tecnologias como plantio direto, recuperação de áreas degradadas e integração lavoura e pecuária eram financiadas pela política agrícola e adotadas sem uma coordenação e uma visão voltada para pro- mover o desenvolvimento sustentável da agropecuária.

Em 2021, o Mapa aprovou uma nova fase da política de agricultura de baixo carbono. O Plano ABC+ visa estimular a adoção e manutenção de sistemas, práticas, produtos e processos de produção sustentáveis (SPSABC) em uma área de 72,6 milhões de hectares, podendo reduzir até 1 bilhão de toneladas de CO2eq até 2030.

Além do potencial de reduzir emissões, é essencial destacar que o Plano ABC+ se fundamenta na abordagem integrada da paisagem como forma de abordar a adaptação dos sistemas produtivos (Tabela 1).

Entre os sistemas, práticas, produtos e processos de produção sustentáveis (SP- SABC), é relevante destacar a inclusão do sistema plantio direto de hortaliças, sistemas agroflorestais, bioinsumos, sistemas irrigados, manejo de resíduos da produção animal, terminação intensiva, além da integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), das práticas para recuperação de pastagens degradadas, do sistema de plantio direto e das florestas plantadas.

 

Tabela 1. Metas do Plano Setorial para a Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária com vistas ao Desenvolvimento Sustentável (Plano ABC+).

Sistema, prática, produto e processo de produção sustentável (SPSABC) Compromisso Potencial de mitigação (milhões Mg CO2eq)(1)
Práticas para recuperação de pastagens degradadas (PRPD) 30 milhões de hectares 113,7
Integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF) 10 milhões de hectares 34,11
Sistemas agroflorestais (SAF) 0,10 milhão de hectares 37,9
Sistema plantio direto de grãos 12,50 milhões de hectares 46,71
Sistema plantio direto de hortaliças (SPDH) 0,08 milhão de hectares 0,88
Florestas plantadas 4 milhões de hectares 510
Bioinsumos (BI) 13 milhões de hectares 23
Sistemas irrigados (SI) 3 milhões de hectares 50
Terminação intensiva (TI) 5 milhões de animais 16,24
Manejo de resíduos da produção animal (MRPA) 208,40 milhões de metros cúbicos 277,8
Alcance em hectares, milhões de metros cúbicos e número de animais 72,68 milhões hectares + 208,40 milhões de metros

cúbicos + 5 milhões de animais

 

1.042,41

Nota: (1)Mega gramas de CO2eq. Fonte: Brasil (2021).

Vale destacar que um dos desafios inatos ao sucesso do Plano ABC+ até 2030 é a integração da agricultura familiar. Levar assistência técnica e extensão rural, estimular investimentos que permitam ganhos de produtividade, adaptação e resiliência é um desafio enorme para transformar a agricultura familiar. Há aproximadamente 3,9 milhões de pequenos produtores. Integrá-los a sistemas produtivos eficientes é um obstáculo que precisa ser superado para fortalecer o desenvolvimento do País.

O potencial de transformar a agropecuária tropical com base em inovação contínua, que integre a agricultura familiar, médios e grandes produtores, é uma condição para fortalecer a agropecuária diante dos impactos do aquecimento global. A meta de recuperar 30 milhões de hectares de pastagens do Plano ABC+ ilustra com clareza as potencialidades de transformar áreas degradadas em áreas produtivas para diversas culturas agrícolas, permitindo intensificar a pecuária e ainda liberando áreas para restauração de vegetação nativa.

Fomentar a recuperação de áreas degradadas, aliada à assistência técnica e adoção de tecnologias, é uma condição necessária para potencializar a produção de alimentos, energias renováveis, fibras e biomassa, livres de desmatamento e, sobretudo, baseada na recuperação da fertilidade do solo. Recuperar solo é um desafio inerente ao fortalecimento e diversificação da agropecuária brasileira.

Minimizar e manejar os impactos do aquecimento global na produção agropecuária torna-se um desafio cada vez mais presente. De acordo com mapeamento feito pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em 2022, os estados de Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul tiveram uma redução de 24 milhões de hectares na produção de soja, milho, arroz e feijão, o que gerou prejuízos na casa de R$ 70 bilhões (Oliveira, 2022).

Financiar a adoção das SPSABC é outro desafio inerente ao alcance das tecnologias. O Programa ABC, agora denominado Programa ABC+, é a linha de financiamento vinculada ao Plano ABC+, muito embora existam outros programas no Plano Safra que também financiam as tecnologias, como o Programa de Modernização da Agricultura e Conservação de Recursos Naturais (Moderagro), o Programa de Incentivo à Inovação Tecnológica na Produção Agropecuária (Inovagro), e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), além dos fundos constitucionais. Historicamente, a tomada de recursos do Programa ABC+ tem crescido, somando-se R$ 16,34 bilhões entre as safras 2015/2016 e 2022/2023 (Banco Central do Brasil, 2023).

A recuperação de pastagens e o plantio direto são as tecnologias mais financiadas, valendo destacar que manejo de solos – compreendendo adoção de práticas conservacionistas de uso, manejo e proteção dos recursos naturais, incluindo correção da acidez e da fertilidade do solo, adubação verde e corretivos – tem ganhado espaço.

O Plano ABC+ é organizado em torno de programas e estratégias, voltados para disseminar a adoção das SPSABC e aprofundar o envolvimento dos estados com base nos Planos ABC+ estaduais, técnicos agrícolas, extensionistas, pesquisa pública e privada, empresas, bancos, cooperativas e todos os atores inerentes à produção agropecuária. O Programa de Acesso a Crédito e Financiamentos associado ao Programa de Cooperação Estratégica, por exemplo, deverão ser explorados para alavancar o financiamento, incluindo financiamento privado, tendo as SPSABC como critérios verdes, bem como o estabelecimento de redes e projetos de cooperação entre vários atores.

Considerações

Aumentar a produtividade, adotar inovações de forma contínua, reduzir a intensidade de emissões, recuperar a fertilidade do solo, favorecer práticas e medidas que permitam adaptar cada sistema produtivo são elementos centrais que compõem o rol de desafios para a agropecuária nas próximas décadas. Saliente-se o potencial de incluir agricultores familiares e médios, integrados a cadeias produtivas.

A transformação da agropecuária no contexto dos sistemas alimentares inclui, intrinsecamente, a agropecuária de baixo carbono como uma condição necessária para ampliar a segurança alimentar.

O Brasil tem, com o Plano ABC+ e a disseminação da cultura da agropecuária de baixo carbono em todos os atores da cadeia produtiva, incluindo o setor financeiro e de pesquisa, uma estratégia ambiciosa para as próximas décadas.

É razoável considerar que bioinsumos, sistemas agroflorestais, plantio direto de hortaliças, novas tecnologias incluídas no Plano ABC+ podem trazer múltiplos benefícios para a produção de alimentos, incluindo agricultores familiares. Somado a práticas produtivas, à agricultura 4.0, à biotecnologia e à edição gênica, entre outras ferramentas, a agropecuária tropical terá um vasto conjunto de instrumentos para crescer em sintonia com um enfoque tropical de desenvolvimento sustentável.

Quando se coloca os ODS em perspectiva, a agropecuária é de fundamental importância para erradicar a fome e garantir segurança alimentar (ODS 2), o que é necessário, por sua vez, para contribuir significativamente com o fim da pobreza (ODS 1), sem perder de vista os desafios relacionados ao aquecimento global (ODS 13) e ao uso sustentável dos recursos naturais (ODS 15). Outros ODS são facilmente incorporados à equação quando se assume a contínua necessidade de inovar, adaptar, gerar empregos capacitados, promover padrões de produção e consumo sustentáveis, entre outros.

O futuro da agricultura brasileira: 10 visões

Baixe o livro completo clicando aqui

BIBLIOGRAFIA E LINKS RELACIONADOS

LIMA, R.C.A. ; HARFUCH, L. Agropecuária de baixo carbono e inovação: Uma agenda essencial para o futuro da agropecuária brasileira. In: O FUTURO DA AGRICULTURA BRASILEIRA 10 VISÕES. PENA JUNIOR, M. A. G.; FRANCOZO, M. A. S. (ed.). Brasília, DF: Embrapa, 2023, 114p.

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Tags: Agricultura de baixo carbono, agronegócio, Bioinsumos, Desenvolvimento sustentável, inovacao, Segurança alimentar

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