Práticas da agricultura conservacionista para o Cerrado

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(Curadoria Agro Insight)

Hoje a curadoria é sobre o manejo e a conservação do solo e da água no Cerrado. Neste sentido, trouxemos um artigo da Embrapa sobre os princípios e práticas que devem ser seguidos e adotadas pelos produtores.

Agricultura conservacionista: conheça os preceitos e práticas para o Cerrado

Em tempos de busca pela sustentabilidade dos sistemas agropecuários frente às mudanças climáticas e ao aumento dos custos de produção, a agricultura conservacionista, que reúne um complexo de tecnologias de caráter sistêmico para preservar e restaurar ou recuperar os recursos naturais com o manejo integrado do solo, da água e da biodiversidade compatibilizados com o uso de insumos externos, se mostra como caminho viável e necessário para que o produtor rural garanta a eficiência e a rentabilidade da produção e ainda preserve o meio ambiente.

Independente do sistema de produção e da região, a agricultura conservacionista segue três preceitos fundamentais:

  • a redução ou supressão de mobilização de solo;
  • a manutenção de resíduos culturais na superfície do solo;
  • a diversificação de espécies, em rotação, consorciação e/ou sucessão de culturas.

Quanto menor o revolvimento do solo, menor é a exposição desse solo à erosão e às perdas de matéria orgânica e de carbono por oxidação. Além disso, há menos gasto de energia e combustível com o revolvimento do solo.

Para manter o solo estruturado, é importante a rotação de culturas e a diversificação do sistema de produção, já que diferentes plantas têm diferentes tipos e profundidades de raízes. A soja, por exemplo, é uma leguminosa com raiz principal pivotante e sistema radicular mais superficial. Já o milho e a braquiária são gramíneas de sistema radicular fasciculado ou “em cabeleira”, ou seja, contam com muitas raízes para explorar o solo superficialmente e em profundidade, e tendem a estruturar melhor o solo, favorecendo a estruturação e agregação do solo.

O clima do Bioma Cerrado é sazonal, com estações chuvosa e seca bem definidas, embora as chuvas não sejam muito regulares na estação chuvosa, podendo ocorrer veranicos. A soja de ciclo precoce (em torno de 100 dias) permite a segunda safra em muitas regiões, que pode ser de milho caso a região tenha uma estação chuvosa mais prolongada ou com perspectiva de continuidade das chuvas. Outras opções são o sorgo, que produz grãos, o milheto, que proporciona cobertura de solo e as plantas de cobertura, como a crotalária e a braquiária nos sistema de Integração Lavoura-Pecuária (ILP). Também pode ser usado um mix de plantas de cobertura, com a mistura de sementes de várias espécies leguminosas e gramíneas para diversificação do sistema.

A diversificação pode ser feita por meio de sistemas de rotação, consorciação ou sucessão de culturas. A diversificação também é importante para a supressão do efeito de pragas e doenças.

Além dos três preceitos, uma série de práticas rigorosas são contempladas pela agricultura conservacionista. As principais são apresentadas a seguir:

Não queimar restos culturais

Isso permite a cobertura do solo e posterior incorporação de carbono ao solo. A queima desses resíduos é indesejável por volatilizar carbono para a atmosfera, contaminando o ar.

Manejo Integrado de Pragas (MIP)

É um importante auxiliar em sistemas conservacionistas de uso e manejo do solo. Enquanto o nível de controle não é atingido, o monitoramento continua a sendo feito.

Inseticidas seletivos tendem a prejudicar menos os inimigos naturais das pragas, e que existem empresas que produzem inimigos naturais para liberação no campo, prática já muito comum em cana de açúcar e outras culturas – o controle biológico.

Controle de tráfego mecânico, animal e humano sobre o solo agrícola

Contribui para minimizar a compactação do solo. Nessa prática conservacionista, as máquinas para preparo de solo, plantio, controle de pragas, colheita, entre outras, percorram somente zonas trafegadas estabelecidas na área de produção, ou seja, os locais exatos por onde os pneus vão passar. Para isso, é necessário o uso de GPS ou sistemas de RTK (sigla para Real Time Kinematic, ou cinemática em tempo real) para controlar, de forma automatizada, o tráfego das máquinas pelos mesmos rastros.

Pesquisas realizadas em canaviais brasileiros mostram que o simples controle de tráfego, com as máquinas trafegando apenas na entrelinha da cana de açúcar, possibilitou aumento de até 20% na produtividade.

Outro meio de minimizar a compactação do solo pelas máquinas é aumentar a largura dos rodados, prática mais comum nos Estados Unidos e em algumas regiões brasileiras. Podem ser usados tratores filipados (com rodado duplo ou triplo nos eixos), que proporcionam aumento da área de pneu, diminuindo a pressão sobre o solo. No entanto, há o pisoteio em uma área maior.

Precisão na aplicação de insumos agrícolas

A aplicação de adubo conforme a análise do solo e o uso de defensivos de acordo com a necessidade para o controle de pragas e doenças são dois bons exemplos. Mas a regulagem do maquinário também é essencial. Não adianta ter a análise de solo e a recomendação de plantio se a máquina não for bem regulada, pois ela não irá semear de maneira uniforme ou adequada. O mesmo vale para os pulverizadores.

Aptidão agrícola das terras

Antes de produzir numa área, deve ser observada a sua aptidão agrícola, fazendo-se o uso mais racional a partir de suas características e potencialidades. Existem áreas mais aptas à lavoura, de maior facilidade para a mecanização, de relevo mais plano e sem pedregosidade, com fertilidade mais elevada ou mesmo de fertilidade baixa, mas com solo de mais fácil correção, como é o caso de amplas áreas do Cerrado.

A aptidão agrícola da área varia conforme as limitações existentes. Se a área é mais acidentada ou pedregosa, há problemas para a mecanização e há maior susceptibilidade à erosão. Nesse caso, deve ser utilizada como pastagem ou reflorestamento, representando um uso econômico mais racional, com menos revolvimento do solo, e intervenções e maior cobertura do solo. Mesmo em áreas de lavoura, há diferentes classes de aptidão.

Capacidade de utilização do solo

No Cerrado, as lavouras de grãos atualmente mais produtivas estão sobre Latossolos de textura argilosa e muito argilosa, onde há maiores teores de matéria orgânica do solo (MOS).

Os solos do Cerrado podem ser menos favoráveis quanto à retenção de nutrientes, o que pode ser contornado com o manejo da adubação. Produtividades elevadas também podem ser obtidas em solos arenosos, como os do Oeste da Bahia.

A MOS é um componente fundamental na sustentabilidade do sistema agrícola, associada à capacidade de troca de cátions (CTC) do solo principalmente em solos tropicais e especificamente em solos do Cerrado. Assim, a MOS está muito relacionada à capacidade do solo de reter e fornecer nutrientes às plantas.

Diversificação de sistemas de produção

Segundo Sá, a diversificação é positiva do ponto de vista ambiental, por evitar o monocultivo. A soja pode ser altamente rentável, mas quando inserida em rotação com o milho, a safra seguinte da leguminosa é favorecida, pois há quebra de ciclo de pragas, doenças e nematoides. Já o capim braquiária aumenta a sustentabilidade do sistema por melhorar a qualidade do solo, e a pecuária é outra fonte de renda.

Adição de material orgânico ao solo

O solo tem uma capacidade de decompor matéria orgânica por meio da atividade microbiana. Os solos tropicais, por estarem sob temperaturas e umidade mais elevadas, têm um potencial elevado de decomposição de matéria orgânica, principalmente na estação chuvosa. É preciso haver um aporte de material orgânico (palha, restos culturais) constante e suficiente para manter os teores de matéria orgânica do solo em níveis adequados.

Se o produtor queima os resíduos da lavoura após a colheita, haverá menor aporte de matéria orgânica e uma redução da MOS ao longo do tempo. No caso da monocultura de soja, leguminosa que produz pouca palha e que se decompõe rapidamente, ocorre a incorporação de pouco carbono ao solo. Já o milho incorpora grande quantidade de palha, que se decompõe mais lentamente. Assim, para que haja a constante adição de material orgânico compatível com a demanda biológica do solo, a recomendação é realizar a rotação de culturas.

Redução ou supressão do intervalo de tempo entre colheita e semeadura (processo colher-semear)

Preconizado fortemente para o Sul do Brasil, o processo de colher uma cultura e imediatamente semear outra tem o intuito de deixar o solo o menor tempo possível descoberto. Se o produtor demorar a plantar outra cultura, a palha residual da cultura anterior poderá se decompor nesse período, descobrindo o solo. Por isso, quanto antes plantar a cultura seguinte, melhor.

No Cerrado, devido à sazonalidade das chuvas, o que favoreceu a adoção do processo colher-semear foi o advento da soja de ciclo precoce e superprecoce, que permite a segunda safra de milho, sorgo ou milheto, dependendo da região, ainda durante a estação chuvosa.

Eliminação da soqueira do algodão

Nas regiões onde se cultiva o algodão, o que inclui também as regiões produtoras do Cerrado, não é recomendado o plantio da fibra todos os anos numa mesma área por questões fitossanitárias, necessitando-se de um intervalo de pelo menos dois anos. Além disso, é preciso eliminar as soqueiras (restos culturais), que podem ser removidas ou incorporadas ao solo para evitar a proliferação de um besouro, o bicudo-do-algodoeiro, principal praga da cultura.

A destruição da soqueira pode ser feita com o uso de herbicida, mas para que o produto seja efetivo, deve ser aplicado no algodão colhido mais próximo do início da safra, quando ainda há alguma umidade no solo. Se for colhido no meio da safra, já em plena estação seca, o herbicida não fará muito efeito, pois a soqueira da planta não vai absorver o produto, havendo rebrota, ou “escape”. Nesse caso, recomenda-se a destruição mecânica.

Implantação de práticas mecânicas e/ou hidráulicas

O pesquisador salienta que em um sistema conservacionista, não basta fazer apenas Plantio Direto, sendo necessário adotar um conjunto de ações integradas, para que o sistema seja caracterizado como Sistema Plantio Direto. O terraceamento e o cultivo em contorno ou curvas de nível são práticas que minimizam o escoamento da enxurrada e melhoram a infiltração de água no solo.

Os terraços e curvas de nível diminuem a energia cinética da água da enxurrada. O plantio em curvas de nível faz com que os sulcos de plantio e as plantas atuem como microterraços e forneçam pontos de infiltração para a enxurrada. Assim, o papel dessas práticas mecânicas é disciplinar e reduzir a velocidade de escorrimento da enxurrada.

O plantio em linha reta morro abaixo não é recomendado para o Cerrado.

Cordões vegetados

São uma alternativa ao terraceamento, com cordões de vegetação permanente de espécies como capim elefante, cana de açúcar ou feijão guandu, que podem quebrar a velocidade de escorrimento da enxurrada e tendem a favorecer a infiltração de água. Nesse sentido, o cordão de vegetação permanente pode ser vantajoso, sobretudo em pequenas áreas. Além disso, essas espécies podem servir como forrageiras.

Mulching vertical

Mais usado em pequenas áreas no Sul do Brasil, é construído por uma máquina apropriada que abre valetas pequenas e estreitas, onde caem ou são dispostos os resíduos culturais, favorecendo a infiltração de água. É uma prática que pode substituir o terraço, de modo a permitir que as máquinas possam realizar o plantio em toda a área.

Alocação adequada de carreadores e estradas rurais

São práticas auxiliares à conservação do solo. Uma estrada mal dimensionada pode causar erosão em área agrícola, dando origem a voçorocas.

Quebra-ventos

São barreiras formadas por árvores que cortam a velocidade principal dos ventos. Em períodos de baixa umidade relativa do ar, o vento remove a umidade de lavouras e pastagens do Cerrado, que tem grandes áreas planas e descampadas. O vento também carrega poeira e pode dispersar pragas e doenças.

Os quebra-ventos podem minimizar esses problemas, mas devem ser plantados de forma perpendicular ao sentido dos ventos predominantes.

Áreas de culturas perenes

Em culturas como o café e as frutíferas, os princípios e práticas conservacionistas são os mesmos: manter o solo coberto e permeado por raízes na maior parte do ano; minimizar o revolvimento do solo; e fazer o cultivo em nível, pois as linhas de plantio passam a funcionar como pequenos terraços, interceptando a velocidade de escorrimento da enxurrada.

As plantas invasoras são controladas com roçadeira nas entrelinhas e com herbicida ou mesmo capina manual na projeção da copa ou coroamento (“pé”) das plantas. Nos sistemas orgânicos, elas podem ser controladas com roçadeira e, no coroamento, exclusivamente com capina. Com o crescimento das plantas, a sombra da copa inibe o desenvolvimento de invasoras e facilita o coroamento. Outra opção é o consórcio com braquiária, que se torna uma planta de cobertura permanente, mas requer roçagens constantes.

Pecuária

Nos sistemas pecuários, o conservacionismo envolve o planejamento do local das cercas e estradas, a distribuição de cochos e bebedouros nas pastagens, de modo a evitar a erosão, entre outras medidas. Muitos casos de voçoroca se iniciam em antigos trilheiros de gado. O recomendado é planejar a divisão dos piquetes e a distribuição de cochos e bebedouros de modo que o gado não ande nesse sentido e percorra a área o mais uniformemente possível”, afirma o pesquisador.

Sá lembra que a pastagem pode proporcionar cobertura de solo adequada, mas o terraceamento pode ser uma prática complementar, principalmente para a conservação da água.

O manejo adequado da pastagem também é importante, pois em pastos degradados o solo tende a ficar exposto. Dessa forma, a adubação, a correção do solo e o controle do pisoteio e das taxas de lotação, ajustando a quantidade de animais de acordo com a capacidade de suporte, também são práticas conservacionistas.

Não usar fogo em pastagens

Ainda comum em áreas de pastagens contínuas no Cerrado, o fogo pode ter efeitos drásticos em áreas mais acidentadas. Após as primeiras chuvas, boa parte das cinzas escorre para as baixadas, causando eutrofização (acúmulo de nutrientes e matéria orgânica) dos cursos d’água.

No Cerrado, onde os solos já são naturalmente mais pobres em nutrientes, a queima pode acelerar o processo de degradação. Nutrientes como nitrogênio e enxofre são perdidos por volatilização (via fumaça), enquanto o potássio e alguns macro e micronutrientes permanecem nas cinzas. Se as cinzas forem removidas com as chuvas, eles também serão perdidos.

Conclusões

Aos seguir esses preceitos e medidas preconizados pela agricultura conservacionista, o produtor rural contribui para a estabilidade da atividade, para a economia do País e o bem-estar das gerações futuras, pois esses princípios visam à sustentabilidade da atividade agrícola, conservando o solo, a água, o ar e a biota dos agroecossistemas, além de prevenir a poluição, a contaminação e a degradação dos ecossistemas e demais sistemas do entorno, reduzir o uso de combustíveis fósseis e contribuir para amenizar a emissão de gases de efeito estufa.

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Tags: agricultura-conservacionista, conservacionismo, manejo integrado de pragas, sistema plantio direto

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