(Curadoria Agro Insight)
Hoje, na curadria Agro Insight, compartilhamos um texto de José Luiz Tejon Megido, jornalista e publicitário, sócio-diretor da Biomarketing. O artigo é na verdade um capítulo do livro “O Futuro da Agricultura Brasileira – 10 Visões” . Livro busca compilar em dez capítulos a opinião de grandes analistas e formadores de opinião do setor.
Introdução
Foram 50 anos de impactos contabilizados na economia do País, na integração do território, no conhecimento de cada palmo do chão brasileiro. Nas águas e mares, campos, em tudo o que foi originado, e que nos próximos 50 anos será originado com repercussões extraordinárias na dignidade do povo, na capilaridade e distribuição de renda que a pesquisa brasileira da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) nos permite obter. O cinturão tropical do planeta Terra ganhou maioridade, significa doravante segurança alimentar, energética e ambiental do planeta.
Neste capítulo abordamos a junção de três conceitos, que, reunidos como num “lego”, mostram que as realizações da Embrapa já os compreendem profundamente. Trazê-los à tona dá visibilidade e percepção; aprumá-los na consciência da gestão dos próximos 50 anos nos ajudará ainda mais na sustentabilidade percebida dessa nossa Embrapa. Agribusiness, design, marketing estão no nosso DNA e, ao dominá-los, sem dúvida, a edição desses genes nos fará cada vez mais eficazes, competitivos e vitais para o País e para o mundo, alcançando os “memes” das percepções humanas.
Centenas de centenas de descobertas e de criações inovadoras, falar de algumas delas termina sendo injusto por não mencionar milhares de outras. Em entrevista, o pesquisador da Embrapa Décio Gazzoni (informação verbal), membro do Conselho Científico do Agro Sustentável (CCAS), recobrou algumas boas lembranças de feitos geniais. Falou-se, então, de manejo de praga de solos; de tropicalização da soja; de plantio direto; de integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF); de inoculação e coinoculação; de irrigação do Semiárido; de carne carbono neutro; de biodiversidade como oportunidade de inovação na Amazônia; de balde cheio; de manutenção de um banco de germoplasma, a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (Cenargen).
Esse “aperitivo” citado anteriormente, de feitos, serviu para nos inspirar e espera-se que a todos inspire, pois os próximos 50 anos já estão aqui nas pesquisas do presente revelando o resultado do futuro. Então, vamos ao agribusiness transformado num sistema de saúde, ao design thinking estratégico da sociedade colaborativa e ao marketing ético que ausculta legítimas necessidades humanas e as soluciona com adoção percebida em velocidade.
O mix agribusiness, design, marketing & Embrapa
Pode parecer interessante essa associação de Embrapa com “marketing”. Agribusiness com design, também. Significa a arte da inovação e pesquisas nas quais os “genes” reeditados, e as nanopartículas transformadas compõem uma nova estrutura. Mas, marketing?
Nesses 50 anos, os pesquisadores da Embrapa explicam muito mais os legítimos fundamentos dessa palavra anglo-saxônica do que milhares de livros e outros cases. O maior estudioso e especialista vivo de marketing no Brasil, o professor doutor Marcos Cobra (Informação verbal), por anos coordenador da cadeira de marketing da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV EAESP), afirmou ao autor do presente capítulo que, de verdade, “marketing não é ciência nem arte, é a forma de identificar sonhos, desejos, necessidades dos consumidores, muitas vezes ainda não percebidos por eles, oferecendo produtos e serviços que tragam felicidade, alegria e prosperidade para as pessoas”.
Quando se olha a oferta de soluções e inovações, transformações que a Embrapa gerou nesses 50 anos, é possível afirmar que a Empresa e seus pesquisadores e pesquisadoras são a melhor representação do marketing ético no complexo sistêmico do agribusiness brasileiro. Quantas dessas soluções estavam conscientes na mente dos produtores, na indústria do antes da porteira ou no desejo de consumidores finais de alimentos, fibras, energia e de suas marcas agroindustriais? Quantos pediam sementes híbridas, quantos queriam plantio direto, quantos solicitavam engenharia genética? Qual o clamor por manter um Cenargen sagrado para a humanidade? Quantos imaginavam que poderíamos plantar trigo no Cerrado, fixar nitrogênio no solo e ser líderes da soja no planeta? Qual pesquisa de percepção dos stakeholders em torno da Embrapa identificaria uma clara percepção da importância da agricultura de baixo carbono, de ILPF?
Em dia de campo na Fazenda Santa Brígida, em Ipameri, Goiás, da senhora Marize Porto Costa (informação verbal), hoje um símbolo nacional do sistema ILPF, lhe foi questionado como e por que ela fez o que muitos anos antes o pesquisador João Kluthcouski dizia para todos e ninguém fazia? Sua resposta foi simples: “Eu fiz o que estava no livro que ele me deu e segui seus conselhos”. Então, o citado pesquisador foi questionado por que Marize fez o que ele mostrava para muitos que não fizeram? Sua resposta: “Porque ela era dentista e não pecuarista”. Quer dizer, a Embrapa faz exatamente a essência maior da definição de marketing de Marcos Cobra, pois a Empresa enxerga antes o que ninguém viu. Percebe, investe, estuda, vence barreiras, não de- sanima, persiste e anos após se transforma, sim, em felicidade, prosperidade e alegria percebida e consciente para as pessoas.
Enquanto este capítulo estava sendo redigido, seu autor visitava em Concórdia, Santa Catarina, a Embrapa Suínos e Aves. Entrevistou o chefe-geral Everton Luiz Krabbe (informação verbal), que revelou o quão vital é a atividade dessa Embrapa para a segurança da saúde animal. Também, para o que para muitos é invisível: o esforço gigantesco da manutenção e acompanhamento do estado da arte da evolução genética das aves e suínos. Isso no sentido extraordinário de segurança estratégica do agro brasileiro nesses dois campos, nos quais somos grandes players mundiais, com agroindústrias, comércio e serviços de imensa importância na economia e com capilaridade em toda sociedade brasileira. Também em Concórdia, o autor deste capítulo ficou impressionado com o trabalho desenvolvido há anos com biodigestores e biogás. O assunto já é falado há muito tempo, porém, sempre com elevada desconfiança, como certa utopia; e se, de novo, perguntássemos à sociedade se consideraria investimentos e pesquisas em biodigestores e biogás fundamentais para o País, acredita-se que a imensa maioria não colocaria esse tema nas preferências ao longo do tempo. Entretanto, ali o doutor Airton Kunz (informação verbal), pesquisador de digestão anaeróbica, remoção/recuperação de nutrientes e resíduos de água, mostrou conhecimentos profundos, que, agora, com o plano “metano zero” do governo federal, serão transformados em produtos e serviços tangíveis, novamente ilustrando a definição ética de marketing.
Mas, poderia ser questionado se o marketing tem como filosofia de administração a gestão das percepções dos consumidores, da sociedade como um todo. Levando-se em conta a propaganda, vendas, marcas, merchandising nos pontos de venda, canais de distribuição, database, mídias, impulsionamento de redes sociais, impactos nos corações e mentes de consumidores atuais e prospects via o poder criativo das mensagens, como a Embrapa é percebida para ser “a voz” do agro brasileiro pela sociedade brasileira?
Exatamente com essa curiosidade, para fechar esse círculo de raciocínio fundamentado no conceito integral e ético de marketing, o autor deste capítulo conseguiu que uma organização europeia, a Onglobal Strategy, fizesse uma pesquisa de percepção, pro bono (obrigado), com a sociedade brasileira em abril de 2020, exatamente com essa questão: “Qual empresa, marca, tem reputação e credibilidade para falar em nome do agro do país?” (Silva; Simões Filho, 2022). Essa pesquisa trouxe uma constatação preciosa para a nossa Embrapa, ante a comemoração de seus 50 anos: a resposta dos entrevistados foi exatamente Embrapa. E, observem, a pesquisa foi feita com toda sociedade, em sua maioria urbana. Significa dizer que existe um patrimônio de marca, de legitimidade conquistada e que superou o tempo. Isso representa para a sociedade brasileira um importante aspecto: temos na Embrapa o aspecto sine qua non para o sucesso da difusão, informação, promoção do País; um emissor, com autoridade reconhecida que pode falar ultrapassando filtros perceptuais que eliminam qualquer mensagem já no nascedouro, quando o emissor não é confiável.
Marketing, então, numa outra supersimples definição (Uslay, 2009), é satisfação do consumidor com lucro. A Embrapa gera satisfação do consumidor, é reconhecida, e, sem dúvida alguma, o lucro obtido precisa ser “contabilizado” para que nunca falte investimentos e recursos que continuem mantendo esse trabalho magnífico de transformar o presente no resultado do futuro, cada vez maior.
Agribusiness é outra palavra anglo-saxônica, que tem conexão total com a Embrapa. Os professores Goldberg e Davis (1957), na Universidade de Harvard, nos anos 1950, enxergaram que agropecuária sem ciência, tecnologia, insumos e máquinas não existiria. Da mesma forma que transporte, armazenagem, agroindústrias, supermercados e consumidores finais são clientes dos produto- res, e que esse sistema é totalmente interdependente; cada elo se conecta ao próximo. Em outras palavras, agribusiness vai desde a ciência, do gene, das tecnologias até a persuasão e escolhas dos consumidores finais, os seus “memes”, como explica Dawkins (2006), passando pelos originadores nos cam- pos, águas e mares e agregação de valor industrial, comercial e de serviços.
Dessa forma, vamos observar nos próximos 50 anos, quando a Embrapa completar 100 anos, uma total proximidade do pesquisador, do cientista com o consumidor final de alimentos e todos os derivados da agropecuária. Será preciso educar a população para a ciência, pois ela está presente em tudo. Preconceitos e desinformação podem significar atrasos e riscos para a saúde humana e ambiental na Terra.
Há 2 anos, Goldberg (2018) afirmou que o sinônimo de agribusiness daqui para frente será health system, um sistema de saúde, do solo, água, plantas, meio ambiente, e que os agricultores no mundo passarão a ter um valor diferenciado, se constituindo em “agentes da saúde” responsáveis pela inteligência da gestão em cada um dos seus microbiomas, assegurando produtos saudáveis em todos os sentidos. Caberá ao setor agroindustrial, comercial e de serviços se aproximar dos produtores oferecendo condições para que utilizem corretamente a ciência disponível, como também suas marcas precisarão mostrar aos consumidores finais o compliance, a economia circular de toda sua cadeia produtiva, engajando consumidores num consumo consciente. O quanto a Embrapa tem papel protagonista nessa tendência inexorável? Ray Goldberg disse ao autor deste capítulo: “Vivemos uma era de desconfiança – distrust, tudo precisará ser feito, comprovado e avaliado por organizações ilibadas e científicas”.
Quando a Embrapa apresenta carne carbono zero, fica impossível não acreditar. Quando a Embrapa Meio Ambiente mostra o “design estratégico” de atividades sustentáveis dentro dos seis biomas brasileiros, os estuda e identifica diversos biomas dentro dos biomas, passa a representar essa voz da credibilidade, diminuindo os níveis da desconfiança reinantes hoje no mundo.
O design thinking virando estratégico reúne o “lego” das peças que já existiam, mas não se encaixavam. O solo bem nutrido fornece maior nutrição para as plantas, que trazem mais nutrientes em cada quilo de seus alimentos para os consumidores finais. No Brasil, a Associação Nacional para Difusão do Adubo (Anda) tem a iniciativa Nutrientes para a Vida (NPV), que amplia a visão estética e ética do design da cadeia dos fertilizantes, chegando ao prato dos consumidores não apenas com volume, mas com muito mais riqueza nutricional a cada porção.
A Embrapa reúne na sua fórmula o talento das raízes do agribusiness, do design e do marketing, assim como suas pesquisas e estudos são profundos e antecipam o futuro.
Esses três saberes humanos, quando vistos no microscópio das suas entranhas e quando colocados num telescópio auscultando o que a humanidade precisará – mas ainda não percebeu que precisará – transforma o agribusiness numa agrocidadania. Para o professor Ray Goldberg, a agrocidadania envolve responsabilidade com segurança de alimentos (sua originação e sustentabilidade), saúde e nutrição dos clientes e cidadãos; o design, nos games da tecnologia da informação digital reunindo o impensável; e o marketing como o descobridor dos desejos, sonhos e necessidades ainda ocultos.
Constatamos que nestes 50 anos a Embrapa foi um autêntico melting pot, pois sua constituição criada pelo então ministro da Agricultura Luiz Fernando Cirne Lima, colocada em pé por Alysson Paolinelli e outros “guerreiros“, permitiu que centenas de brasileiros fossem ao mundo e retornassem para tropicalizar esses conhecimentos, criando uma segurança planetária no seu cinturão tropical, onde, no passado, quase nada se sabia de ciência agrícola.
Mas a Embrapa significou e significa uma autêntica orquestra, um grandioso elenco, em que a diversidade venceu pela reunião de distintos conhecimentos. E daqui pra frente cada vez mais design thinking será. Com certeza, a expressão de Winston Churchill6 na Segunda Guerra Mundial pode ser transportada para a obra da Embrapa: “nunca tantos deveram tanto a tão poucos”.
Desafios do setor
Quanto ao Brasil? Dobrar o agribusiness brasileiro de tamanho, buscando nos próximos 10 anos a marca do US$ 1 trilhão na soma das suas cadeias produtivas, reu- nindo o antes, o dentro e o pós-porteira das fazendas. Assim, com isso, dobrarmos o produto interno bruto (PIB) do País buscando US$ 4 trilhões, o mínimo considerado aceitável para uma nação com a nossa dimensão e com o conhecimento que possuí- mos, tão bem pela Embrapa representado.
Biogás, bioenergia, carbono, metano, água, diversos nichos e segmentos de oportunidades em cada microbioma do Brasil farão desta nação a única no mundo com nome de árvore, a ser aplaudida como o terroir da paz e da felicidade para todos. Mas isso é otimismo? Uma utopia de paraíso tropical? Não, muito ao contrário. Termina-se com o escritor, dramaturgo e poeta paraibano Ariano Suassuna, que dizia: “O otimista é um tolo, o pessimista um chato, eu sou um realista esperançoso”. Realistas esperançosos, Embrapa 50 anos, e sobre o futuro? Não o temo ao me vir pela frente, e sobre ele só uma coisa podemos fazer agora, neste instante presente: decidir “com quem” a esse futuro iremos! Com a Embrapa, juntos até o centenário!
Considerações finais
Neste capítulo abordamos a junção de três conceitos, que, reunidos, mostram as realizações da Embrapa em seus 50 anos de existência: agribusiness, design e marketing, que estão em nosso DNA e, ao dominá-los, nos farão cada vez mais eficazes, competitivos e vitais para o País e para o mundo, alcançando as mais profundas percepções humanas.
É cada vez mais preciso educar a população para a ciência, pois ela estará presente em tudo no futuro. Preconceitos e desinformação podem significar atrasos e riscos para a saúde humana e ambiental na Terra.
Nos próximos 50 anos, quando a Embrapa completar 100 anos, acontecerá uma total proximidade do pesquisador, do cientista com o consumidor final de alimentos, e todos os derivados da agropecuária e o Brasil vão continuar avançando para alcançar metas cada vez maiores, ajudando o nosso PIB a crescer de tamanho.
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BIBLIOGRAFIA E LINKS RELACIONADOS
ALVES, E.; VIEIRA FILHO, J.E.R. Brasil, o futuro do agribusiness. In: O FUTURO DA AGRICULTURA BRASILEIRA 10 VISÕES. PENA JUNIOR, M. A. G.; FRANCOZO, M. A. S. (ed.). Brasília, DF: Embrapa, 2023, 114p.
DAVIS, J. H.; GOLDBERG, R. A. A concept of agribusiness. Boston: Harvard University, 1957. DAWKINS, R. The selfish gene. Nova Iorque: Oxford University Press, 2006.
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