Falta de estratégias do governo tira a chance brasileira de liderar o mercado global de fitoterápicos
Faturamento no país atingiu o ínfimo percentual de 0,1% dos 216,4 bilhões de dólares movimentado pelo setor em todo o mundo
Detentor de uma das maiores reservas de biodiversidade do planeta, o Brasil poderia ser referência em soluções fitoterápicas. No entanto, o país tem importado mais do que exportado em todos os segmentos dessa cadeia produtiva e, enquanto o mercado global de fitoterápicos foi avaliado em US$ 216,4 bilhões em 2023, o faturamento do setor no Brasil atingiu apenas 0,1% desse valor em 2022 (US$ 173 milhões). A mudança desse cenário demanda uma lição de casa, como mostra o novo estudo do Instituto Escolhas “Fitoterápicos: como destravar essa cadeia a partir da agricultura familiar”, lançado em 14 de maio.
“Além de não trazer propostas efetivas para o setor de fitoterápicos, o Plano de Ação para a Neoindustrialização, lançado em janeiro pelo vice-presidente e ministro Geraldo Alckmin, não inclui o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) nas poucas sugestões trazidas para o setor. Ou seja, mais uma vez, o país coloca os fitoterápicos em um caminho descolado da realidade nacional, deixando para trás aqueles que detêm o conhecimento tradicional sobre as plantas medicinais”, alerta Sergio Leitão, diretor-executivo do Escolhas.
“Nem mesmo a elaboração da Estratégia Nacional de Fitoterápicos prevista pelo plano – algo em que, vale pontuar, já estamos mais do que atrasados – envolve o MDA. A pergunta que fica é: como esperar resultados efetivos no setor sem o envolvimento do órgão que atende seus fornecedores primordiais?” Aqui, vale pontuar que o prazo de 90 dias para a revisão do plano pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) encerrou-se em abril e, até agora, não há qualquer retorno sobre o resultado.
O estudo do Escolhas mapeou um total de 514 processos de regularização de um total de 343 produtos fitoterápicos. Esses processos foram solicitados junto à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) por 68 empresas (sendo 61 de grande ou médio porte, 6 empresas de pequeno porte e uma microempresa), majoritariamente localizadas na região Sudeste, sobretudo em São Paulo (25), no Rio de Janeiro (8) e em Minas Gerais (8). Não foram identificadas cooperativas ou associações de pequenos produtores. Entre as empresas identificadas, 80% têm como atividade principal a “fabricação de medicamentos alopáticos para uso humano”.
Além disso, análises da legislação vigente para as políticas públicas de plantas medicinais e fitoterápicos no Brasil revelam que as exigências legais e sanitárias estão muito distantes da realidade de produtores de plantas medicinais e produtos fitoterápicos de base familiar e comunitária. A maior parte dos requisitos pode ser atendida apenas por empresas privadas do setor industrial, especialmente em função do investimento financeiro necessário para o cumprimento das etapas definidas em lei. “Isso mostra que a agricultura familiar vai perdendo espaço nesse mercado, embora o segmento seja crucial para a preservação das plantas medicinais e dos conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade”, destaca Leitão.
Para mudar o cenário, a pesquisa do Escolhas elencou sete propostas de ações de suporte à agricultura familiar e de adequação da legislação ao porte da atividade na cadeia produtiva. Entre as propostas está a formalização de uma nova categoria de produto fitoterápico com critérios adequados aos pequenos produtores, a abertura de mercados institucionais e a ampliação da agenda de fitoterápicos dentro do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA).
“Outro ponto fundamental é o investimento em Assistência técnica efetiva e permanente, com estratégias especificamente direcionadas às cadeias produtivas de plantas medicinais, aromáticas e condimentares e produtos fitoterápicos. Essa é outra frente que depende do envolvimento do MDA, para que o setor de fitoterápicos no Brasil alcance a posição de referência global que lhe cabe”, finaliza Leitão.
Leia o estudo aqui.