(Curadoria Agro Insight)
A curadoria Agro Insight de hoje traz uma publicação dos pesquisadores da Embrapa, Ailton Reis e Maria Isabella de Souza Feitosa, sobre uma importante doença entre as cucurbitáceas, a antracnose.
Antracnose da melancia, melão e pepino: identificação e manejo
A família Cucurbitaceae compreende aproximadamente 95 gêneros e 950 espécies, que se encontram amplamente distribuídas pelo mundo, sendo de ocorrência mais expressiva em regiões de clima tropical e subtropical (Schaefer; Renner, 2011). As cucurbitáceas estão entre as 15 famílias de hortaliças mais cultivadas no mundo. Neste cenário, as que mais se destacam, são: melancia [Citrullus lanatus (Thunb.) Matsum. & Nakai], melão (Cucumis melo L.), pepino (Cucumis sativus L.) e abóboras (Cucurbita spp) (Almeida, 2002).
A maior parte da produção das cucurbitáceas é destinada à alimentação humana, mas também é usada na alimentação animal e para fins terapêuticos. Quanto aos aspectos nutricionais, seus frutos são fonte de minerais e vitaminas (principalmente A e C), na forma de carotenoides e ácido ascórbico (Romano et al., 2008).
As sementes de abóboras apresentam alto valor nutricional devido à grande quantidade de ácidos graxos insaturados que possuem (Bisognin, 2002; Feijó, 2005).
As cucurbitáceas estão sujeitas à ocorrência de diversas doenças, seja de origem abiótica (provocadas por desequilíbrios nutricionais ou condições climáticas desfavoráveis) ou biótica (causadas por bactérias, fungos, oomicetos, nematoides e vírus). Os fungos e oomicetos são os principais agentes causadores de doenças em cucurbitáceas, se for levado em conta o número de doenças que causam nestas culturas.
A antracnose é uma das doenças fúngicas de maior importância econômica para maioria das cucurbitáceas, principalmente, em regiões de clima quente, na estação chuvosa. A doença pode ser bastante prejudicial, por acometer as plantas em qualquer fase fenológica, e, atacar todos os órgãos da planta (Tavares, 2002).
Agente causal
A antracnose das cucurbitáceas tem como agente causal, listado na literatura, o fungo Colletotrichum orbiculare (=Sin. C. lagenarium).
Sintomas e sinais
Os sintomas da antracnose em cucurbitáceas podem variar, dependendo da espécie e da cultivar envolvidas. Todos os órgãos aéreos da planta podem ser afetados, tais como epicótilo, cotilédone, folhas, ramos e frutos (Sitterly; Keinath, 1996; Pavan et al., 2016). Entretanto, o mais comum é os sintomas se iniciarem pelas folhas mais velhas, onde se formam lesões pequenas e encharcadas, de coloração pálida, que se tornam necróticas e escurecidas, circundadas ou não por um halo amarelado (Figure 1). Com a evolução da doença, as lesões aumentam de tamanho, podendo coalescer e tomar todo o limbo foliar; neste caso, causando seca e queda dos tecidos, diminuindo consideravelmente o potencial fotossintético da planta (Tavares, 2002; Palenchar et al., 2009).
Figura 1. Lesões necróticas, circulares a irregulares em folha de pepino, caudadas por Colletotrichum orbiculare, agente causal da antracnose. Foto: Ailton Reis
Manejo
O manejo da antracnose deve ser apoiado em um conjunto de medidas que incluem:
- utilização de cultivares resistentes;
- material propagativo sadio;
- realização de práticas culturais adequadas;
- pulverização de fungicidas químicos ou biológicos recomendados e registrados para a cultura (Sitterly; Keinath, 1996; Pavan et al., 2016).
O plantio de cultivares resistentes é a medida de controle mais eficiente para qualquer doença. Infelizmente não há cultivares comerciais de melão resistente a C. orbiculare mas, para a melancia, há registro de algumas cultivares, como Au-Sweet Scarlet, Charleston Gray, Congo, Crimson Sweet, Early Jubilee (PSX 33484), Fairfax e Starbrite (Dias et al., 2010). A maioria dos híbridos comerciais de melancia, disponíveis no comércio no Brasil, tem a cultivar Crimson Sweet como um dos parentais. Esta cultivar é resistente à raça 1 do patógeno e a doença não tem sido muito comum no país. Em pepino, as cultivares Runner (tipo Aodai) e os pepinos de conserva Colônia, Guaira, Prêmio e Supremo possuem resistência ao patógeno (Carvalho et al., 2013).
Cultivares resistentes
Quando não há disponibilidade de material resistente, deve-se assegurar que o material propagativo utilizado tenha sido produzido sob controle rígido de qualidade e devidamente tratado com fungicidas (Cardoso et al., 2001).
As práticas culturais que desfavorecem o estabelecimento e/ou agravamento da doença, são (Cardoso et al., 2001; Terao et al., 2019):
– rotação de culturas (por dois a três anos) com espécies não hospedeiras de C. orbiculare;
– destruição dos restos de culturas, visto que poderão abrigar a fonte de inóculo que servirá para novos ciclos de infeção, a curto e longo prazo, pois, podem permanecer viáveis por até dois anos;
– destruição de cucurbitáceas silvestres;
– adubação equilibrada;
– manejo criterioso da irrigação, evitando sempre o molhamento das folhas;
– desinfestação de equipamentos e maquinários utilizados durante os tratos culturais
Fungicidas
No tocante à utilização de fungicidas para a melancia, são recomendados no site do Agrofit (Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento – MAPA) 53 fungicidas, dentre sistêmicos e protetores, em um total de 13 princípios ativos:
– clorotalonil;
– azoxistrobina;
– mancozebe;
– tebuconazol;
– tiofanatometílico;
– folpete;
– hidróxido de cobre
– imazalil
– imibenconazol
– fluxapiroxade
– captana
– óxido cuproso
– procimidona.
Para o melão, há 53 fungicidas com 13 princípios ativos:
– clorotalonil
– azoxistrobina
– mancozebe
– hidróxido de cobre
– tiofanato-metílico
– folpete
– imazalil;
– lufenurom;
– captana;
– óxido cuproso;
– procimidona;
– tiabendazol;
– triflumizol;
– clorotalonil;
– mancozebe;
– hidróxido de cobre;
– tiofanato-metílico;
– captana;
– óxido cuproso
Para o pepino, há 35 fungicidas, com 6 ingredientes ativos (Agrofit, 2003):
– clorotalonil;
– mancozebe;
– hidróxido de cobre;
– tiofanato metílico;
– captana;
– óxido cuproso.
Controle biológico
Com relação à utilização de agentes microbiólogicos para o controle de C. orbiculare, há vários relatos de sucesso utilizando Streptomyces endofíticos, Bacillus pumilus, Bacillus subtilis e Curtobacterium flaccumfaciens (Raupach; Kloepper 2000). Tem sido documentado também a utilização de estirpes de patógenos avirulentos ou hipovirulentos. (Muslim et al.,2019) verificaram que plantas de pepino tratadas com isolado binucleado hipovirulento de Rhizoctonia induziu a resistência sistêmica à antracnose em plantas inoculadas com C. orbiculare. A utilização de isolados de Trichoderma spp. tem apresentado resultados promissores.
Silva et al. (2011), verificaram redução na severidade da antracnose do pepineiro em níveis de 56,36 a 88,39%, em relação à testemunha, utilizando isolados de Trichoderma. A maior redução foi obtida mediante aplicação de T. harzianum. Entretanto, ainda não há produtos biológicos registrados no MAPA para controle de antracnose em cucurbitáceas.
Outra alternativa, que poderá ser usada no futuro, são extratos vegetais. Estes teriam a vantagem de não apresentarem restrições toxicológicas quanto ao uso. Colpas et al. (2009) observaram que plantas de pepino tratadas com extrato de manjericão cravo (Ocimum gratissimum), induziram resistência à Colletotrichum orbiculare, reduzindo significativamente a incidência da doença.
BIBLIOGRAFIA E LINS RELACIONADOS
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