A semeadura do algodão safra já foi iniciada pelas principais regiões produtoras do Brasil. Na sequência, virá o plantio das áreas de segunda safra – maior parcela da cultura no país.
A partir da emergência, a depender da região e clima, devemos ter em média de 160 a 180 dias de convívio com esta cultura até conhecermos o seu resultado. Para uma cultura de trato anual é um tempo considerável e, por vezes, dentro da operação do dia a dia não conseguimos associar o manejo à produtividade.
Pois então, como conseguimos encarar o dia a dia e estar atentos ao resultado ao mesmo tempo?
Dividindo toda a jornada em pequenas partes e tendo dentro destas metas, ou mini-metas – jargão popularmente conhecido dos amantes do futebol, em que no planejamento do ano o time não pensa diretamente na final do campeonato, mas como serão as partes da competição a cada rodada ou grupo de rodadas.
Para entenderem do que estou falando, a própria abordagem vou dividir em partes.
1 – Pequenas partes: fenologia
A cultura, a partir de sua implantação, tem um ciclo de crescimento e desenvolvimento que passa por fases fenológicas. Pensar em cada fase fenológica é saber quais são os processos metabólicos que estarão acontecendo naquela planta, entender quais são suas necessidades e metas e contrastar com as condições de ambiente e manejo.
Temos duas grandes fases durante esse ciclo, as fases vegetativa e reprodutiva. Dentro dessas fases acontecem “eventos clássicos” que marcam de maneira mais acentuada os processos metabólicos. Por exemplo, praticamente em todas as culturas temos o R1 como um momento marcante pois é justamente a virada da fase vegetativa e reprodutiva, a mais brusca da planta.
No algodão temos uma subdivisão dentro da fase reprodutiva, 3 partes de eventos marcantes fazendo com que a cultura tenha 4 eventos clássicos passando pelas fases:
Fase V: Da emergência ao primeiro botão floral. Desde a operação de implantação e manutenção da população planejada; um período crucial da formação radicular;
Fase B: É quando o primeiro botão floral é emitido e vai até o aparecimento da primeira flor. Nesta fase inicia-se a formação da carga reprodutiva e controle de porte;
Fase F: Aparecimento da primeira flor, período em que a planta tem a maior aceleração do metabolismo, sustentando a parte vegetativa e reprodutiva a todo desenvolvimento. Em contrapartida é o período de maior demanda de insumos de produção (água, luz, temperatura, nutrientes) e maior sensibilidade;
Fase C: É quando a planta tem a sua primeira posição emitida aberta em forma de capulhos. É um momento ainda de forte demanda de insumos de produção, mas já num aspecto mais de final de ciclo. Na transição entre a fase F e C, inclusive, é onde devemos estar cientes à finalização da planta, ou “capação”. Deste ponto trabalhamos até a maturação total da planta e os preparos para a colheita.
2 – Mini-metas: OKRs
Aqui acho válido aproveitar o momento e apresentar como embutir uma ferramenta de gestão dentro das fases fenológicas ou dos agrupamentos de tempo e/ou eventos que queira considerar como eventos clássicos, o OKR.
OKR ficou popularmente conhecido por ser o modelo de metas utilizado pelo Google, onde os colaboradores e os gestores definiam as metas em conjunto.
OKR vem de O, de objetivos (objective) e KR, de resultados chaves (key results) que basicamente trabalham em conjunto onde os resultados chaves tentam trazer maior clareza sobre o cumprimento dos objetivos, mesmo quando há elementos mais lúdicos.
Um exemplo mais lúdico e pragmático, ao mesmo tempo, seria: “quero ser reconhecido como um grande produtor” como objetivo e “produzir 10% a mais que a média da região” é o resultado chave que diz que eu sou um “grande produtor“. Veja que o resultado chave (KR) situa o cumprimento do objetivo (O).
Tal qual este exemplo que pode te sinalizar qual o OKR máximo da safra, cada evento clássico determinado terá um OKR, ou vários outros grupos de OKR.
Se você leu o PDCA do plantio e associar até aqui, verá que aquelas perguntas e respostas podem ser respondidas por OKRs. Cada segmento com o seu (janela de plantio, gasto de semente, taxa de emergência, população de plantas, rendimento operacional).
Voltando à fenologia como o marcador de eventos clássicos, cada fase dessa terá seus próprios OKRs.
Fase V: Manter ou proteger o número final de plantas planejadas por hectare, lavoura no limpo durante o PCPI, área e sanidade foliar seriam algumas metas e padrões de lavoura consolidados que temos;
Fase B: Controlar porte de plantas, mas fechar linha, construir caixa vegetativa e reprodutiva da planta ao mesmo tempo, manter sanidade foliar, proteção de pragas;
Fase F: Minimizar ao máximo os efeitos de abortamento de estruturas, definir tempo de formação da caixa produtiva, manter sanidade foliar, proteção de pragas;
Fase C: Terminar o enchimento, suplementações, manter sanidade foliar, proteção de pragas, preparo para a colheita.
Quanto mais conseguirmos medir, mensurar, transformar em número, mais palpável será a análise do OKR, porém não podemos descartar o nosso conhecimento e as premissas já consolidadas da agricultura, mesmo não medidas por impossibilidade ou viabilidade, por exemplo, todos nós sabemos que é importante que uma lavoura feche as suas entrelinhas e não precisamos ter uma medida complexa de monitoramento, basta um sim ou não, fechou a linha ou não.
Claro que abaixo de tudo isso ainda existe uma camada tática, super importante, que é o “como fazer” e que remete a operação.
Determinei que devo ter meu plantio (evento clássico) considerado como um plantio satisfatório se ele tiver população final variando 10% da meta estabelecida (KR) e para fazer atingir isso eu vou regular a plantadora de tal maneira e vou fazer checagens de plantabilidade 4 vezes ao dia, as 06:00, 12:00, 18:00 e 00:00. Esta ultima parte em itálico é o tático.
Desta maneira, decompondo o seu OKR macro, que geralmente está conectado a produtividade (pode ser financeiro), nós conseguimos chegar a traçar a sua trajetória até as operações mais básicas e iniciais já que os indicadores são derivativos.
Imagine que queira produzir 350@/ha de algodão em caroço em uma cultivar de peso médio 4.0g. Para isso precisará de 1.312.500 capulhos por hectare.
Esta cultivar tem recomendação de 90.000 plantas/ha, ou seja, cada planta precisará ter em média 14.5 capulhos. Pronto!
Neste exercício rápido e básico já conseguimos traçar vários cenários de acompanhamento das lavouras sabendo que para atingir a meta padrão, lá na semeadura e na emergência tenho que ficar dentro da população de 90.000 plantas/ha para ter plantas de 14.5 capulhos. Para qualquer lado que for este indicador ele terá influência sobre os KRs do evento seguinte para manter o objetivo, isso quando é possível!
Se destas 90.000 plantas eu ficar com 80.000 plantas, precisarei de 16.3 capulhos por planta para manter as 350@/ha, o que parece possível de recuperar, mas e se eu ficar com 55.000 plantas/ha?
Vale lembrar que pela didática não estou considerando outros fatores, como leis de equilíbrio. Por exemplo, pode ser que os capulhos não pesem do mesmo jeito quando uma planta é responsável por 14 ou 17 estruturas.
Portanto, ter mini-metas esclarecidas e demarcadas para nortear as ações e prioridades do manejo do dia a dia para poder encarar cada dia com atenção e foco total, pode ser uma eficiente maneira de gerenciar sistemas de produção de alta complexidade.
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Rinaldo Grassi Pirozzi
Engenheiro Agrônomo