Na curadria de hoje, vamos falar de um livro lançado na última quarta-feira (8) pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A publicação sobre “Potencialidades e desafios do agro 4.0” apresenta contribuições da Embrapa, cujos pesquisadores Ricardo Inamasu e Édson Bolfe traçaram um panoramasobre as soluções tecnológicas, desafios e perspectivas para alavancar o agro brasileiro.
Em um relato sintético, Inamasu faz uma explanação sobre as culturas mais adeptas à agricultura de precisão (AP) e digital, desafios e caminhos para disseminação e adoção da técnica do país, que possam produzir impacto em curto prazo. Segundo ele, a cadeia de grãos em geral, incluindo sorgo, arroz e feijão, é a mais suscetível ao emprego da AP, mas já se percebem avanços nas culturas de soja e milho.
Na opinião do pesquisador, a cultura de algodão, produzida por agricultores que, na grande maioria também produzem grãos, na segunda safra ou como principal, compartilham máquinas como as de trato cultural e preparo do solo e plantio, detém infraestrutura de pessoal e equipamento equivalente ao de grãos. “Portanto, aqueles que já utilizam a tecnologia de AP e agricultura digital (AD), utilizam-na também na produção do algodão”, avalia Inamasu.
Outros setores como o de cana-de-açúcar também já apresentam esforços na adoção da tecnologia. Mas, para Inamasu, as culturas de café, laranja e uva são as que têm avançado de forma mais organizada, enquanto os demais produtos da fruticultura empregam a AP e AD de maneira mais isoladas. Ele acredita que, nas culturas de eucalipto e pinus, o emprego das duas tecnologias poderia ser mais expressivo, por contar com empresas mais estruturadas cuidando da produção.
Especialista em agricultura de precisão, o pesquisador da Embrapa Instrumentação diz que a pecuária tem recebido um tratamento mais especializado. “Tanto na produção de gado de corte como no tratamento do gado de leite, os setores de produção têm recebido atenção para identificação de animais e buscam um acompanhamento individualizado”, esclarece.
No caso da produção leiteira, por exemplo, o pesquisador lembra que já é possível observar o uso de tecnologias da robótica, mas, no Brasil, o avanço é freado devido ao custo, inclusive de suporte de manutenção. Em hortaliças, a iniciativa “vertical farming”, conceito de agricultura para o cultivo de plantas dentro de edifícios ou de vários andares de arranha-céus, ainda recente, pode usar tanto a agricultura de precisão como a digital.
De acordo com o pesquisador, o setor possui potencial para um controle refinado e automatizado do ambiente, incluindo o biológico. Ele acredita que ainda haverá uma evolução mais significativa nessa cadeia.
Conceitualmente, Inamasu avalia que tanto a agricultura de precisão como a digital podem ser empregadas em qualquer das culturas existentes, incluindo a extrativista, para auxiliar na localização de indivíduos em áreas de exploração. No entanto, ele lembra que há dois fatores preponderantes para a adoção.
O primeiro é a facilidade de adoção, que inclui a capacidade do produtor de absorver e dominar o conhecimento, como suporte financeiro de investimento, enquanto o segundo está atrelado ao potencial de retorno econômico. “Portanto, apesar de existir disponibilidade de tecnologias mais para uma cultura do que para outra, o fator mais preponderante para adoção é o preparo do produtor”, afirma o pesquisador.
Mas Inamasu enfatiza que tanto a agricultura de precisão como a digital podem ser adotadas por todos os produtores, independente de tamanho, pequeno, médio ou grande, conforme retratado por Édson Bolfe em levantamento do Radar AgTech. Para isso, ele diz que é importante que o produtor tenha disposição e preparo para utilizar dados digitais nas suas decisões.
Desafios e caminhos para adoção de AP e AD
O pesquisador Ricardo Inamasu sugere que, para a adoção da AP, os conhecimentos existentes deveriam ser adaptados e ajustados às condições de produção local, incluindo as características edafoclimáticas tropicais, sistemas de produção como plantio direto, plantio em duas safras anuais e em condições de integração-lavoura-pecuária-floresta (ILPF), produções agroflorestais e bioinsumos.
“Há necessidade de um esforço público e privado, como pesquisa em âmbito da fazenda (research on-farm), para que as tecnologias sejam ajustadas ou cocriadas já no local de uso”, sugere o pesquisador.
No caso da AD, Inamasu diz que a produção das tecnologias é emergente e o cenário não é claro como em AP. Segundo ele, muitos trabalhos acadêmicos, apesar do otimismo em relação aos usos de tecnologias, como inteligência artificial (IA) e internet das coisas (IoT), parecem não ter clareza no propósito e na direção que AD e a 4.0 estão sendo trabalhadas.
“Essa falta de clareza pode ser danosa ao gerar entendimentos e ações divergentes para a agricultura. É necessário que as comunidades sejam incentivadas a se integrarem e a interagirem, principalmente as do setor agropecuário, com a de Tecnologia da Informação e engenharias, para que a convergência das tecnologias possa resultar em um propósito sustentável e inclusivo dos diversos elos das cadeias de valores”, avalia.
Além da falta de cobertura de sinais no campo, o pesquisador considera a falta de padrão dos dados utilizados e fornecidos por máquinas, equipamentos, softwares e aplicativos, uma das barreiras mais importantes a serem vencidas. “Há necessidade de um esforço nacional para estabelecer e adotar padrões de troca de dados, arquivos e informações, além de uma infraestrutura integradora”, afirma.
Rastreabilidade para agregar valor
O GT Cadeias Produtivas e Desenvolvimento de Fornecedores é coordenado por Isabel Regina Flores Carneiro Roxo, do Mapa, enquanto o subgrupo está sob a responsabilidade do pesquisador da Embrapa Agricultura Digital, Édson Bolfe. Este trabalho é voltado a promover maior integração dos elos das cadeias produtivas, visando à agregação de valor e rastreabilidade da produção, o qual vem realizando reuniões mensais.
No terceiro capítulo do livro, Bolfe explora as novas tecnologias, como IoT e Blockchain, que permitem consultas aos padrões utilizados na produção agropecuária, além dos princípios e critérios socioambientais respeitados. O pesquisador destacou a utilização da rastreabilidade e sustentabilidade para melhorar continuamente as etapas executadas por gestores dos setores primários e dos elos seguintes das cadeias produtivas agropecuárias.
Ele reforçou a importância do fortalecimento da imagem dos produtos agropecuários brasileiros, valorizando principalmente a proteção dos biomas e as ações em prol da redução dos gases de efeito estufa.
O estudo sugere que o avanço para os próximos anos na integração entre os diversos atores das cadeias produtivas – das fornecedoras de insumos agropecuários à comercialização – do agronegócio, instituições de pesquisa, órgãos governamentais, startups e empresas já consolidadas no ramo da tecnologia será essencial para a elaboração de políticas agrícolas e programas de incentivo que efetivamente priorizem o desenvolvimento sustentável da agropecuária nacional.
Coordenador do estudo, Bolfe disse que o subgrupo trabalhou com a integração dos elos das cadeias, dentro da lógica da agregação de valor, rastreabilidade, da produção, pensando em alimento, desde a fruticultura, grãos a proteína animal. O estudo partiu da lógica de que o consumidor está mais consciente em relação aos produtos agrícolas certificados.
“A ideia é como produzir mais com menos, mais alimentos, fibras, energia, mais qualidade, mais sustentabilidade, com menos uso de recursos naturais, insumos. O custo de produção está cada vez mais elevado para o produtor rural. Então, toda a agregação de valor, toda informação adicionada ao produto acaba beneficiando o agricultor e o consumidor”, afirma o pesquisador.
Sibelle de Andrade Silva, diretora de Inovação da Secretaria de Inovação, Desenvolvimento Sustentável e Irrigação (SDI), do Mapa, na live de lançamento, disse que a publicação traz temas de extrema importância, porque trata desde o pequeno produtor até os grandes desafios do agro 4.0. “O livro vai ser um marco para direcionar os trabalhos da Câmara e para que a gente consiga avançar no agro 4.0 ou até mesmo o agro 5.0”, diz a diretora.