A biodiversidade brasileira é uma oportunidade de geração de valor

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(Curadoria Agro Insight)

Na curadoria de hoje, trouxemos um texto da plataforma Visão de Futuro do Agro Brasileiro, sobre as Megatendências do Agro e que aborda as transformações no consumo e a geração de valor a partir da biodiversidade.

Maior geração de valor a partir da biodiversidade brasileira

Pela extensão territorial, variedade de biomas e número de espécies endêmicas, o Brasil ocupa a primeira posição na lista dos 17 países considerados megadiversos. A isso soma-se sua diversidade cultural, construída por meio dos saberes das centenas de povos nativos que aqui habitavam, aos quais foram acrescidas as contribuições trazidas pelos povos que para cá vieram após 1500. Entretanto, a biodiversidade brasileira ainda é pouco conhecida, utilizada e costumeiramente negligenciada, o que faz com que o País deixe de aproveitar o potencial de seus biomas (Corandin; Camillo, 2016).

Poucos produtos originados da biodiversidade nacional vieram à luz e, não raras vezes, isso aconteceu em instituições estrangeiras, como a bradiquinina, um peptídeo isolado do veneno de jararaca, que daria origem mais tarde (e fora do País) ao captopril, um fármaco importante agente de controle da hipertensão. Um claro, porém raro, sinal do potencial de aproveitamento do patrimônio genético brasileiro é o princípio ativo Cordia verbenácea, um anti-inflamatório de grande sucesso comercial desenvolvido no País, baseado no óleo essencial de erva-baleeira, uma planta da família Boranginaceae (Valli Bolzani, 2019).

A diversidade de frutas e outros alimentos nativos ainda é pouco explorada fora de suas regiões de origem. Uma das principais questões é o desenvolvimento de volumes de produção suficientes para a expansão do consumo tanto em termos nacionais como internacionais. O puro extrativismo precisa ser substituído por sistemas de produção sustentáveis. Essas ações contribuem também para a preservação de espécies nativas de biomas ameaçados, como no caso paradigmático do cambuci, considerada uma espécie ameaçada nos anos 1990, e atualmente com produção de cerca de 100 toneladas por ano (Aschemann-Witzel et al., 2021). A geração de valor dos produtos locais, oriundos da biodiversidade nativa, é claramente uma das melhores oportunidades para a preservação dos próprios biomas de onde vêm esses produtos (Silva et al., 2017).

A demanda por produtos como frutas e derivados aumentou durante a pandemia, e os consumidores têm associado esses produtos com um aumento da capacidade imunológica. Além dessa característica de saudabilidade, o consumo de frutas exóticas proporciona ao consumidor estrangeiro parte da experiência sensorial que teria ao viajar, mas sem sair de casa (Graybill, 2021).

Os alimentos, seus aromas e formas de preparo estão intimamente ligados à memória das pessoas, despertando emoções e reforçando aspectos culturais. A vasta biodiversidade e a multiplicidade étnica e cultural do Brasil se combinam, originando grandes oportunidades de geração de valor. Em um país extenso e com grandes deslocamentos migratórios, principalmente em direção às cidades, o alimento regional é, muitas vezes, o único elo material de uma população migrante com sua memória e suas origens, trazendo à tona emoções e lembranças familiares de sua história pregressa; alimentos regionais são percebidos, nesse caso, como comfort food.

Em sentido contrário, a culinária regional soma-se ao turismo rural e às manifestações culturais como atrativos para pessoas de outras regiões, principalmente aquelas que sempre habitaram em ambiente urbano, oferecendo novas experiências sensoriais e culturais aos visitantes. Os alimentos funcionam como símbolo tangível da identidade local que pode ser consumida (Roberts; Hall, 2001).
Um importante aspecto do sucesso das ações de geração de valor em produtos da biodiversidade, além dos já mencionados, é a garantia de que o produto foi obtido de forma sustentável e justa (fair trade) para as populações produtoras locais. Essa garantia só poderá existir se houver uma cadeia de rastreabilidade, para que tanto a indústria de transformação quanto o consumidor final possam ter acesso às informações associadas à origem do produto. Transparência foi a principal característica selecionada por consumidores em uma pesquisa da Innova Market Insights (2021), e transparência não se obtém sem se estabelecer a rastreabilidade na cadeia de valor.

Grandes cadeias de produção de alimentos, de produtos da biodiversidade e redes varejistas possuem compromissos institucionais com a rastreabilidade. É importante mencionar que a necessidade de cadeias de valor rastreáveis vai além da expectativa de sustentabilidade, estando diretamente associada a questões de segurança alimentar.

A percepção de qualidade é fortemente associada aos alimentos regionais como agente de valorização cultural e econômica. O reconhecimento, a proteção e a atestação da conformidade dos produtos e das técnicas tradicionais de preparo aumentam ainda mais esse valor. No Brasil, o número de regiões que oferecem produtos com indicação geográfica (IG) aumentou de 49 para 86, entre 2016 e 2019 (IBGE, 2019), um claro sinal de que este é um dos caminhos para a geração de valor em produtos da biodiversidade brasileira. A certificação também é largamente utilizada em produtos não alimentícios, para associar produtos cosméticos, de perfumaria, móveis e outros às questões de sustentabilidade com respeito às tradições das populações locais.

BIBLIOGRAFIA E LINKS RELACIONADOS

VISÃO de futuro do agro brasileiro: Transformações rápidas no consumo e na agregação de valor. Brasília, DF: Embrapa, 2022. 8 p., 2022.

ASCHEMANN-WITZEL, J.; BIZZO, H. R.; CHAVES, A. C. S. D.; FARIA-MACHADO, A. A.; SOARES, A. G.; FONSECA, M. J. O.; KIDMOSE, U.; ROSENTHAL, A. Sustainable use of tropical fruits? Challenges and opportunities of applying the waste-to-value concept to international value chains. Critical Reviews in Food Science and Nutrition, 12 Aug. 2021. DOI: 10.1080/10408398.2021.1963665

CORANDIN, L.; CAMILLO, J. Introdução. In: VIEIRA, R. F.; CAMILLO, J.; CORANDIN, L. (ed.). Espécies nativas da flora brasileira de valor econômico atual ou potencial: plantas para o futuro: Região Centro-Oeste. Brasília, DF: Ministério do Meio Ambiente, 2016. p. 19.

GRAYBILL, S. Domestic, exotic fruit flavors create tastes that ‘travel’. Beverage Ingredients. 26 Jan. 2021. Disponível em: https://www.bevindustry.com/articles/93811-domestic-exotic-fruit-flavors-create-tastes-that-travel. Acesso em: 3 out. 2021.

INNOVA MARKET INSIGHTS. What, where and how? Consumers want food transparency. Disponível em: https://www.innovamarketinsights.com/blog/what-where-and-how-consumers-want-food-transparency. Acesso em: 3 out 2021.

IBGE. Mapa de indicações geográficas. Rio de Janeiro, 2019. Disponível em: https://geoftp.ibge.gov.br/cartas_e_mapas/mapas_do_brasil/sociedade_e_economia/indicacoes_geograficas_2019_20190919.pdf.

ROBERTS, L.; HALL, D. Rural tourism and recreation. Wallingford: Cabi Publishing, 2001. p. 115.

SILVA, R. R.V.; GOMES, L. J.; ALBUQUERQUE, U. P. What are the socioeconomic implications of the value chain of biodiversity products? A case study in Northeastern Brazil. Environmental Monitoring and Assessment, v. 189, n. 84, 2017. DOI: 10.1007/s10661-017-5772-2.

VALLI, M.; BOLZANI, V. S. Natural Products: Perspectives and Challenges for use of Brazilian Plant Species in the Bioeconomy. Anais da Academia Brasileira de Ciências, v. 91, Suppl. 3, e20190208, 2019. DOI: 10.1590/0001-3765201920190208.

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Tags: Biodiversidade, certificação, embrapa, geração de valor, Megatendências, rastreabilidade

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